Com um terço de vereadores negros e pardos e renovação de vagas, debate racial deve se intensificar na Câmara do Rio

Com um terço de vereadores negros e pardos e renovação de vagas, debate racial deve se intensificar na Câmara do Rio

Após as eleições, houve renovação de 35% das vagas, e entrada de mais jovens e mulheres

RIO — Dentro de um mês, quando a Câmara de Vereadores do Rio se reunir para sua primeira sessão plenária da nova legislatura eleita em 2020, os ocupantes das 51 cadeiras, que vão decidir o rumo das políticas da cidade nos próximos quatro anos, terão um perfil mais diverso do que aquele que fechou o ano passado. A renovação de 35% das vagas trouxe também um aumento na representatividade das mulheres, dos jovens com menos de 29 anos e, principalmente, dos que se declaram negros e pardos, que agora são 30% dos vereadores.

Essa nova composição promete ampliar debates ligados a gênero, raça e diversidade sexual, temas que já foram incluídos na agenda municipal pelo próprio prefeito Eduardo Paes, que formou um secretariado com um perfil baseado na diversidade e afirmou repetidas vezes que faria um “governo antirracista”.

Estreante no parlamento depois de ficar como primeira suplente do PSOL na Alerj em 2018, a vereadora Thaís Ferreira é uma das principais vozes desse movimento. Carioca de 32 anos, liderança comunitária de Irajá, na Zona Norte, e mãe de dois filhos, ela entrou na política estimulada pela vereadora Marielle Franco, assassinada em março de 2018, e promete trazer para as discussões da cidade sua experiência de luta pelos direitos das mulheres e contra o racismo:

— As dificuldades para uma mulher negra e de origem pobre chegar até a Câmara de Vereadores não são pequenas. Nossa chegada acontece porque representa o desejo de muitas pessoas por uma mudança na forma de fazer política e também no perfil dos nossos gestores, que foram tradicionalmente negligentes com as populações mais vulneráveis.

Thaís elegeu como prioridades do início do mandato a luta por vagas em creches municipais e a ampliação das Casas de Parto, referências em atendimento humanizado. Ela também quer lutar para o cumprimento da lei federal que determina o ensino da história da África na rede escolar.

Também estreante, o único vereador do Novo na Câmara, Pedro Duarte, de 29 anos e que se declara como pardo, vê os debates municipais menos ligados às questões de gênero e raça, como acontece na esfera federal e estadual. Ele diz que vai defender o empreendedorismo, a desburocratização e a eficiência nos gastos públicos, mas reconhece que a melhoria dos serviços beneficiaria justamente os segmentos mais vulneráveis, como as mulheres negras e pobres.

— Acho que o debate vai acabar sendo um pouco mais para o lado dos serviços, do dia a dia, mas por óbvio vai se misturar, sobretudo quando falamos de desigualdade. Quando o saneamento melhora na Zona Oeste, ele atinge mais as mulheres, negros, pessoas mais pobres, porque é a realidade — diz.

Mesmo entre os veteranos, a expectativa é que o olhar com o recorte racial tenha mais espaço. Reeleito pelo Republicanos, partido do ex-prefeito Marcelo Crivella, João Mendes de Jesus acha positivo o aumento de vereadores negros e pardos.

— Somos parte importante de um estado e uma capital que tem um número de habitantes negros e pardos emblemático. Porém, como em todo o Brasil, sermos maioria dos habitantes não reflete a realidade das condições sociais e econômicas dos homens e mulheres negros — lembra o parlamentar, que promete pautar o combate ao racismo em sua atuação.

O cientista político Maurício Santoro, da Uerj, afirma que o aumento de jovens e negros na Câmara representa uma transformação gradual que se soma ao secretariado mais diverso da prefeitura, e deve gerar políticas públicas mais sensíveis às demandas populares. Ele afirma que esse olhar é mais importante ainda no contexto da pandemia, que atinge grupos sociais de maneira diferente:

— São vários fatores que atravessam questões de classe social, de raça, e é importante que a Câmara tenha essa sensibilidade — diz Santoro. — É uma geração muito interessante. Temos muitos jovens de periferia que estão falando das dificuldades que eles experimentaram na vida. É importante ter pessoas com essa experiência pensando na política do Rio.

Novo presidente

As novas demandas que devem surgir com a nova composição do Legislativo podem encontrar mais espaço por conta de mudanças que o novo presidente da Câmara, o vereador Carlo Caiado (DEM), promete fazer na condução dos trabalhos e discussões. Ele, que assumiu a cadeira ocupada por mais de uma década por Jorge Felippe (DEM), garante que fará uma gestão buscando convergências e ouvindo as minorias. Uma das principais medidas será criar um Colégio de Líderes, com representantes de todos os partidos, para discutir previamente projetos importantes, como os que devem ser enviados pelo prefeito Eduardo Paes já nas primeiras semanas de trabalho.

fonte:https://oglobo.globo.com/rio/

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